O mexicano Juan Rulfo é um daqueles escritores cujo livro se tornou maior que seu nome. Autor de Pedro Páramo, um dos mais aclamados romances latino-americanos, Rulfo é sempre posto sob o epíteto de sua obra-prima, como se sua produção literária se constituísse de um só título.
Não por menos, O galo de ouro, novela lançada postumamente, por anos fez parte da coletânea O galo de ouro e outros textos marginados. O entendimento é que tudo o que o escritor publicou antes e, sobretudo, depois de Pedro Páramo estaria à margem do monumento que ergueu neste romance. Não deveria.
A nova edição brasileira de O galo de ouro finalmente corrige isso, e ainda traz análises críticas que comprovam a grande obra que é.
A trama acompanha Dionisio Pinzón, um pobre coitado impossibilitado de trabalhar devido a uma mutilação num dos braços. Dessa maneira sobrevive como pregoeiro, sujeito que fica no meio do passeio público fazendo anúncios a plenos pulmões.
Certo dia, é chamado para ser “gritador” numa rinha de galos. Ali resgata um animal à beira da morte e o leva para casa, tratando-o até sua recuperação total.
Com o galo dourado, passa a participar de brigas e acumular seguidas vitórias. Enriquece, começa a frequentar circuitos mais sofisticados, e a soma de certas eventualidades o tornará um homem respeitado, que terá o controle de seu próprio negócio de apostas.
É a história do miserável que se transforma em rei, e todos os reveses que essa mudança radical desencadeará.
Escrita para servir de base para um roteiro de cinema, a novela é sucedida justamente pela sinopse até então inédita do filme, assinada pelo próprio Rulfo. A partir daí, a edição abre espaço para dois textos acadêmicos que irão discorrer, a seus modos, sobre o valor deste livro de origem peculiar.
“Avaliação literária do romance O galo de ouro”, de José Carlos González Boixo, e “Texto para cinema: O galo de ouro na produção artística de Juan Rulfo”, de Douglas J. Weatherford, trazem olhares de estudiosos sobre a obra do escritor mexicano, que detalham os aspectos determinantes para assinalar a qualidade narrativa.
O primeiro demonstra tecnicamente que, embora tenha sido chamada de “rasa, plástica, funcional e sem preocupações estilísticas” por alguns críticos, a novela deve ser situada no mesmo nível que Pedro Páramo e Chão em chamas (contos de estreia do autor). Já o segundo examina as contribuições e a importância de Rulfo para o cinema.
Mantendo-se nessa linha, o livro se encerra com a transcrição de um poema escrito para o média-metragem A fórmula secreta, acompanhado de uma breve análise de Dylan Brennan. São versos de apelo “anti-ianque” sobre um homem comum no qual injetam Coca-Cola no sangue ao invés de soro.
Seja através da poesia ou da prosa, Rulfo se mostra um dos mais importantes escritores da América Latina. Que o novo olhar sobre sua obra desperte o interesse das editoras brasileiras por seus conterrâneos, a exemplo do (con)fabuloso Juan José Arreola, cujo centenário ocorre neste ano.
***
Livro: O galo de ouro
Editora: José Olympio
Avaliação: Muito Bom